Thursday, March 19, 2009

Música fast-food


A globalização, as novas tecnologias, novas mídias e a internet democratizaram de forma brutal a música. Isso é ótimo, hoje podemos ouvir músicas feitas em todos os lugares do mundo. No entanto, o que ocorre é uma espécie de movimento xenófobo musical. O que vemos/ouvimos são movimentos artísticos vindos das periferias de todo o Brasil produzindo um produto cultural de fácil assimilação e reprodução. No NE temos as bandas de forró modernoso, no norte o calypso, no sul/oeste os grupos sertanejos e sudeste o samba-funk reina. A tecnologia serve para fortalecer as cenas destes estilos musicais, a gravação/mixagem musical ficou mais simplificada com o lançamento de computadores de mesa cada vez mais potentes, equipados com placas de som e programas de gravação que tornaram todo o processo muito mais prático, ágil e com muito menos custos. Há, também, uma espécie de auto-pirataria que distribui os novos hits destes grupos, durante os shows há bancas de cds/DVDs que além de comercializarem as gravações de estúdio, também vendem shows anteriores. No entanto o lucro vem mesmo dos shows – Algumas bandas fazem uma média de 25 shows por mês. E este tipo de produto artístico antes restringido a guetos, hoje se espalha de forma avassaladora por todo o país.

A tecnologia fomentou novos mercados para estes grupos (um grupo de forró do Ceará passa três meses em São Paulo fazendo show sem ter uma música sua tocando nas rádios). A produção, distribuição e consumo das obras artísticas se tornam mais baratas todos os dias. A contradição que a tecnologia nos traz é estranha, a população procura consumir um produto barato e que está próximo de sua realidade social. Até aí, tudo bem, no entanto um grupo do outro lado do mundo produz um trabalho hoje e imediatamente podem saber se o que se produziu tem qualidade. Tudo está à mostra, o que há de errado em entregar os ouvidos ao mundo? Temos de nos contentar ao que nos é empurrado. Uma cultura de massa atual, no que tange a música, não procura ser um movimento artístico apenas, mas um novo mecanismo de comercialização de idéias, comportamentos e atitudes.

O filosofo Alemão Theodor W. Adorno (1903-1969) escreveu que a coerência do desenvolvimento da música popular está em contradição com as necessidades que se esperam dela e que ao mesmo tempo satisfazem a população como um todo. O caráter social da música, segundo Adorno, foi excluído do processo criativo. O mais importante é entregar a música ao ouvinte sem se importar com o conteúdo em si, a música serve apenas como escapismo ou para o deleite do ser humano que procura fugir da amargura diária.

Como produto cultural, a música nos dias de hoje recebe um prazo de validade. A temporalidade da música deve-se ao processo canibalismo artístico-musical que impõe que toda produção seja semelhante, ao se ligar o rádio não se reconhece mais quem é o artista que está tocando. A fabricação em massa do produto "música" tornou a obra artística numa espécie de fast-food cultural – barata e de fácil absorção. A reprodução sonora engana o consumidor e o torna cada vez menos crítico em relação ao caráter social da arte. Com isso, não há a auto-reflexão sobre o consumo e a libertação da música como fator de mudança social e gerador de conhecimento. O caráter libertário ou filosófico da música não deve ser subjugado ou relegado ao ambiente acadêmico. Faz-se necessário induzir o indivíduo a questionar-se sobre seu papel na sociedade e para que também valorize a arte que surge entre as camadas mais populares, sim, mas que esta forma artística também possa representar a resistência, denúncia ou servir de crônica social. No entanto, deve-se ter o cuidado para que a manifestação artística não seja integrada pelo interesse econômico. A música não pode ser um produto de consumo rápido. Ela como toda forma artística deve carregar em si a atemporalidade, deve ser etérea e transmitir ao indivíduo uma realidade mais ampla que o capacita a reflexão e a geração conhecimento.


Ouvindo: KOENJIHYAKKEI 2 (ni) - JAPÃO

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